
Traduzo silêncios
Entre as pausas do vento,
escrevo o que as folhas não dizem:
são letras de raiz,
sinais de uma língua antiga
que o tempo apagou na terra.
Traduzo o vão das horas,
o eco de um nome
que a boca guarda, mas não chama.
São mapas de ausência:
pontos cardeais virados ao avesso,
estrelas desenhadas no reverso da noite.
Decifro o murmúrio dos rios
quando param para respirar,
a geometria das sombras
que se dobram em perguntas.
Cada vazio é um verso
escrito em tinta invisível,
um alfabeto de ossos e esquecimento.
Nas cicatrizes do mármore,
leio o que os lábios calaram:
histórias que o fogo não queimou,
canções que a chuva não levou.
Traduzo o não dito,
o peso do ar entre duas mãos,
o intervalo infinito
entre o grito e o granizo.
Sou tradutor de ausências,
intérprete do que nunca foi voz.
Na página em branco do mundo,
assino meu nome em silêncio:
um risco de luz na escuridão,
um verso que o vento não apaga.
abril 2025
©Júlio Miranda

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