
“Soneto” para Florbela da Asa Ferida
Aqui jaz a que escreveu com navalha
versos que sangram rubros de jasmim:
Flor-Bela, flor de espinha e de mantilha,
que fez do sonho um cálice de aguardente.
Teus sonetos são feridas de lume,
confissões que a lua bebeu em segredo.
Entre “sins” e “nãos”, a tua fúria presa
rasgou o véu do amor mais que perfeito.
Ousaste desejar, mulher-planície,
enquanto o Alentejo em ti ardia,
rompendo a cerca do pudor antigo.
Mas que importa a página em branco, Florbela?
Inventaste a tinta que o abismo tem:
cada palavra, cada palavra, um grito de punhal,
cada rima, o pulsar de uma veia aberta.
A morte que buscaste não te encontra:
a saudade que deixas não se encerra —
tua voz é a cicatriz na noite inteira.
fevereiro 2025
©Júlio Miranda

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