
Pictogramas Obsoletos do Amor
Nas paredes do tempo, gravados a carvão,
restam corações que não batem mais —
animais extintos em pergaminho de areia,
símbolos silentes que o sibilante vento
desaprendeu de ler.
Eram setas apontando para o norte de um abraço,
mãos entrelaçadas como raízes retorcidas de um rio seco,
olhos em espiral, cifrando o que o fogo
— fulgurante, fugaz —
jamais traduziu em cinza.
Alguém inscreveu “sempre” em argila fugidia,
e a chuva, alfabeto líquido, lavou a promessa
até sobrar só um fóssil de talvez.
Agora, deciframos sombras:
O arco arqueado de um sorriso em tábuas trêmulas,
a curva calada de um segredo em ossos ocos,
um coração atravessado:
marcas de mãos em muros que o musgo mascara.
Mapas de um território que o desejo
rasurou com a tinta invisível
do adeus.
Pictogramas obsoletos: museu do impossível.
Cada traço, um enigma que o presente deserdou.
Eu os coleciono, arqueólogo do amor,
mas só encontro poeira
— e o eco de um nome
que nem o tempo consegue pronunciar.
Entre o que foi gravado em pedra persistente
e o que se perdeu em água passageira,
o amor inventa sua própria língua morta.
fevereiro 2025
©Júlio Miranda

Deixe um comentário