
Maré de Ausência
À beira do crepúsculo,
o mar desfia seus segredos frios —
ondas quebram em versos antigos,
e eu, só, escuto o lamento dos tímpanos vazios.
A sombra alonga-se na parede húmida,
vestígio de um corpo que já não dança.
A saudade, essa tecelã noturna,
urde fantasmas na palma da lembrança.
O vento traz nomes esquecidos:
vozes que o tempo apagou a giz.
A casa respira em quartos desabitados,
e cada porta é um adeus que não se diz.
Na chávena fria, o chá guarda silêncios,
o relógio mastiga horas sem pressa.
Até a luz, cansada de esperar,
se curva em ângulos de tristeza.
Que fizeste de mim, ó ausência?
Sou navio sem porto, farol que se apagou.
Na mesa, um prato vazio ancora o tempo —
e a noite, infinita, jamais raiou.
Rasga-me o peito, saudade submersa:
em ti, até o vazio transborda.
Leva-me onde os amores não se perdem,
ou deixa-me ser a própria sombra que te borda.
abril 2025
©Júlio Miranda

Deixe um comentário