
“Leve-leve”
A tarde despe-se de pressa
— apenas um fio de sol nas palmas,
o mar enrolado em si mesmo,
lento, como um animal que dorme.
Nada pede o chão sob os pés:
a terra é doce, áspera de sal,
e o vento escreve, em segredo,
nomes antigos na areia.
Esperar? Não há verbo aqui.
O tempo é um fruto que cai
e se desfaz em boca de brisa.
As horas são redes vazias.
Vivo de ver as nuvens —
suas asas de cal, seu peso leve,
o modo como descem
sobre os telhados, como pombas mortas
que renascem em espuma.
Há um silêncio que caminha
entre os corpos, descalço,
e bebe a sombra das árvores.
É assim a vida:
um verso que o mar repete
sem nunca terminar.
Leve-leve,
como o tato da luz nos muros,
como o rumor das raízes
quando a noite as escuta.
Nada mais.
Março 2025
© Julio Miranda

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