
Geografias do Teu Corpo
Tua pele: terra incendiada,
um meridiano em carne viva
onde os paralelos são feridas abertas
e o equador rasga um segredo
que os trópicos sussurram em febre.
As tuas colinas—pecado inaugural—
onde o vento geme no cio da noite,
e teus ossos, espinha dorsal de mundos antigos,
ergueram-se antes de haver deuses
para os desenhar no pó.
Nos teus olhos, naufrágios,
bússolas embriagadas em desejo,
onde astrolábios de sombra e âmbar
tentam mapear a desorientação do meu fôlego.
Tua boca: um rio de incêndios,
língua onde os deuses lambem o sal da criação,
e cada sílaba que escorre dos teus lábios
é um dilúvio de verbo e suor.
Os teus dedos seguram estações e destinos:
no outono, és a febre que arde sob a pele,
no inverno, o gelo que corta
e no verão, o incêndio descontrolado
onde perco qualquer vestígio de nome.
Ah, o teu ventre—epicentro do caos,
onde a fome do cosmos pulsa em espiral,
e o umbigo, essa cicatriz do universo,
é o vórtice que suga todos os mapas
para um ponto sem regresso.
Nada em ti é domável.
Nem montanha, nem vale, nem vulcão
que adormece apenas para enganar a terra.
O tempo tenta escrever-te,
mas tu és geografia que não se desenha,
um continente que se ergue e se desfaz
a cada sílaba que grito
enquanto te devoro.
março 2025
©Júlio Miranda

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