
Dia Mundial da Árvore da Poesia
(Diálogo inicial)
Ela diz: — Folhas dançam, o chão é verso.
Ele ri: — Cada sílaba, fruto que disperso.
Eu sussurro: — Raízes são metáforas:
a terra escreve o que a copa sonha.
1.
Galhos estendem alfabetos ao vento,
vogais verdes, consoantes de lentidão.
A casca, mapa de antigas trovas —
cicatrizes que o tempo decifra em segredo.
2.
Sementes? Rascunhos.
Germinam em papel de chuva,
desdobram-se em redondilhas,
florescem em metáforas ad libitum.
3.
Amanhece: o sol é um soneto raso,
ilumina o musgo — rima concreta.
Formigas carregam endechas mudas,
enchem o formigueiro de quadras breves.
4.
Às vezes, a árvore sangra tinta âmbar:
versos coagulados, seiva de nostalgia.
Pássaros bicam as folhas soltas —
poemas-asa que o horizonte coleciona.
5.
Noturno: a lua recita Drummond
para as raízes, sussurros subterrâneos.
O vento vira página no bosque,
e o mundo é um livro aberto — sem fim.
6.
(Quem disse que poesia é só humana?
A terra assina vilancetes em raízes,
o rio desenha ‘odés’ no seu leito,
até a pedra tem seu verso livre.)
Pós-escrito da terra:
Celebrem-me em sílabas, cortem-me em livros,
mas deixem-me viver nos interstícios —
onde a poesia brota sem dono,
e cada árvore é um poeta em eterno exílio verde.
21 de Março 2025
© Julio Miranda

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