
Bifurcação do Coração
Não sou rio que corre num só leito
nem pássaro de um único ninho.
Sou constelação — pontos dispersos
numa mesma vastidão de céu.
O que fazer quando o coração
se parte em dois caminhos inteiros?
Não fragmentos quebrados,
mas duas estradas completas.
Um amor que é mar aberto,
outro que é montanha firme.
O primeiro traz liberdade nas ondas,
o segundo, força nas raízes.
A sociedade exige exclusividade
como se o peito fosse uma prisão
e não um universo em expansão,
capaz de conter galáxias.
Dizer: escolhe! —
é como pedir para cortar uma mão.
Direita ou esquerda?
Ambas são minhas, ambas seguram vida.
Duas pessoas, duas linguagens
para um mesmo sentimento visceral.
Uma traduz o fogo,
outra traduz o ar.
Nenhuma tradução é mentira.
Em cada um, amor genuíno:
não dividido, multiplicado.
Não é matemática banal,
é geometria de dimensões paralelas.
Quem disse que o coração
conhece limites ou fronteiras?
Só quem nunca sentiu sua vastidão
pode acreditar num amor único.
A crueldade não está em amar dois,
mas em forçar a escolha
entre metades igualmente verdadeiras
de um mesmo infinito.
Minha culpa é só a coragem
de sentir o que sinto,
e a covardia de ocultar
esta bifurcação do coração.
abril 2025
© Julio Miranda

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