A Última Carta do Poeta Desconhecido

Entre a tinta e o esquecimento,
Rasgo o véu deste silêncio bruto:
Palavras que o tempo não ouviu
São a herança do meu sofrimento.

Páginas cheias de espanto e vento,
Nenhum verso foi lido, nem fruído —
Como pó no altar do não-vivido,
Assim se ergue meu monumento.

Minha voz, nau de naufrágio certo,
Buscou estrelas em mar revolto;
Fiz da noite um manto, do abrigo — deserto.

Agora, calo a pena e a chama apago:
Que esta carta, escrita com o lado amargo do dia,
Seja a semente que alguém há de achar,
Quando meu nome for só poeira no vazio.

Assinarei com uma lágrima, não com sangue:
O poeta desconhecido
Deixa aqui seu fogo mudo —
Para que a noite o leve,
E o amanhecer o tenha esquecido.

abril 2025
© Julio Miranda

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