Carta às Sombras do Amor

Na teia do tempo, onde os dias são atores,
ergues teu palco de véus e veludos—
o Grande Amor, espelho de ardores,
que tece sonhos, mas foge aos sentidos.

Vinte e cinco luas a separar os passos,
e tu, dona de gestos ensaiados,
beijas a ilusão em labirintos rasos,
onde o Diretor dança com os teus pecados.

Parabéns! — gritam as máscaras vazias
pela arte de trocar almas por miragens:
duas traições, três vidas, noites frias,
e um coração roubado nas passagens.

Bebes da fonte que julgaste imortal,
Amor Perfeito, néctar de quimeras—
enquanto os rastos, na estrada lateral,
são silhuetas que a brisa afasta, leves.

Ergue a bandeira (oh, Dama dos Moinhos!),
veste os gigantes que só tu enxergas.
O mundo é um palco onde teus desatinos
escrevem tragédias em tinta alheia.

Os fantasmas que deixaste na ribalta
seguiram rumos, despiram tuas algemas—
encontraram a felicidade nua, sem falta,
enquanto danças com sombras nas arenas.

E no fim, quando a cortina desaba,
resta-te o Reino das Ilusões, teu lar:
um abraço de “até sempre” que acaba
num suspiro… “Sê feliz a fingir amar.”


P.S.

Os moinhos, querida, são só moinhos.
Mas quem sou eu para estragar teu véu?
Desenha gigantes nos teus caminhos—
afinal, o palco é sempre teu.

(Um brinde à mestra do teatro alheio,
que troca finais felizes por um só desejo.)

fevereiro 2025
©Júlio Miranda

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