
O Peso das Horas Vazias
Entre quatro paredes que não falam,
o relógio mastiga segundos como espinhos.
Seus ponteiros desenham cicatrizes no ar,
e eu, sentinela de um castelo sem portas,
invento diálogos com sombras na parede:
Quanto tempo cabe num suspiro esquecido?
Na estante, as cartas murcham em envelopes fechados,
letras apodrecem como flores de plástico.
A tua voz era um rio; hoje, calha entupida
de silêncios. Até o telefone envelheceu,
oblíquo no canto, carregando pó e números
que ninguém mais disca. Esperei que a noite
desembrulhasse estrelas, trouxesse respostas
— mas a lua, cirurgiã de mentira,
sutura nuvens e deixa a ferida aberta.
Dizem que o vazio é um copo à espera de vinho.
O meu transborda de horas ácidas,
vinagre de minutos que não fermentam
em amor. Talvez a dúvida seja o último abrigo:
perguntas sem resposta são janelas quebradas
por onde entra o vento — frio, mas vivo.
Agora, quando o eco do teu nome me visita,
aprendo a não nomear o que se desfez em fumaça.
O peso das horas? São asas de chumbo
num pássaro que ainda acredita
em migalhas de céu.
maio 2025
© Julio Miranda

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